quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Pré-venda do livro "Não alimente o escritor - a escritora"

 


            Vai sair o meu "Não alimente o escritor - a escritora" na coleção Quem dera o sangue fosse só o da menstruação, da editora Hecatombe / Urutau. É um poema que aborda os acontecimentos vividos por mim quando fui detida, durante a realização de uma performance, em Porto Alegre, em 2010. Na ocasião, fui escoltada por dez policiais e duas motos e conduzida em uma viatura até a delegacia, debaixo de um grande tumulto e consternação do público. Vocês podem imaginar que uma experiência como essa não fica quietinha e incólume, nos dentros da gente. E eis que, uma década depois, consigo finalmente chorar (chorar mesmo, de lavar o colo e molhar a blusa) ao revisitar, agora garganta aberta, os ritmos que se guardaram no corpo, e ficaram aqui, reverberando, inauditos, incomodando tanto.

         Publicar esse livro é, também, uma oportunidade de agradecer publicamente a cada uma e cada um que teve, naquele momento, e depois, um gesto. Foram muitos, também, os que compreenderam o que poderia estar por vir, mesmo num ambiente em que a cultura da aniquilação e da bota-na-cara não eram tão visíveis quanto hoje: o fascismo dormia, debaixo das camas. Não pensem que os recentes acontecimentos não influíram na vontade de publicar esse poema-denúncia, cheio de memórias espinhosas. A truculência e todo o ambiente cultural que a alicerça já estavam lá, em semente, naquele episódio.

         Foram dez anos difíceis, para mim, quase impossíveis, apesar de tudo que se seguiu. Tirei energia, não sei nem de onde (do mar? do amor? --- da poesia, principalmente), para me refazer. É claro que, naquela noite, o tempo virou, e nunca mais voltei ao estado anterior. Mas ele vive, em mim. Vivi o mau tempo se armando, com meu corpo dilacerado, impedido, detido, cerceado, depois atormentado por todas as estratégias de difamação e de diminuição de quem eu era e do que fazia. Corri o risco: enfrentei. Paguei o preço. E enfrentar-se com essas estruturas não é fácil. A gente sai ferida, e é de fera machucada esse poema, que deu conta de expressar sentimentos difíceis, procurando também colaborar para a reflexão sobre autoritarismo e violência contra as mulheres.

        Sou é grata, agora, pois encontrei espaço, esses anos todos, no estudo, e na vontade -- fui seguindo, trabalhando, trabalhando, trabalhando: me aprimorei. Estou aqui, feliz por poder dizer, agora, o que precisa ser dito. E que eu digo com sangue, sim. Porque tem coisas que são assim: uma hora elas arrebentam, molham a blusa, explodem e espocam. Num tempo com tão pouco espaço para a lentidão, lanço um livro que é arrebentação de década (e o próximo, também será), na certeza de que o tempo lento é bom de se viver.

         Este é o link da pré-venda: https://benfeitoria.com/n%C3%A3oalimente.