quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Dois poemas transcriados em espanhol por Juan Manuel Terenzi


Por ocasião de minha participação no Mundial Poético de Montevideo, em novembro, surgiu a necessidade de traduzir três poemas de meu livro Depois da água para o espanhol. Esta foi a provocação inicial, que acabou se ampliando para um número maior de textos e gerando um processo generoso de descobertas e alegrias tanto para o tradutor quanto para a autora. A transcriação foi realizada com esmero por Juan Manuel Terenzi, cujo talento e preciosos insights embelezaram as versões.

Hoy no salió
el sol.

Se me fue
mi otoño.

Hoy el sol
abrió sus arenas
en las venas
de mi cama.

Tan tristón
tan sin vez.

Se me fue
el eco
del desierto.

Hoy el sol
lagrimeó
un tango antiguo
olvidado.

No pasó de largo
ni bailó por el cielo.

Hoy el sol
papel e hielo.

Escalofrío de luz
en el epicentro
del silencio.

Hoy el sol
es un son

de adentro.


Hoje o sol
não saiu.

Sumiu
de mim
meu outono.

Hoje o sol
abriu suas areias
nas veias
da minha cama.

Tão tristonho
tão sem vez.

Sumiu 
de mim
o eco do deserto.

Hoje o sol
chorou
um choro antigo
violado.

Não mirou de lado.
Nem andou no céu.

Hoje o sol
é de papel.

Arrepio de luz
no epicentro
do silêncio.

Hoje o sol
é um som
de dentro.


Juan Manuel Terenzi cresceu em um ambiente bilíngue: espanhol (Argentina) em família e português na escola. É graduado em Engenharia Química e em Letras Espanhol na UFSC. Atualmente finaliza o mestrado em Teoria Literária, estudando a obra de Juan Carlos Onetti, e cursa a graduação em Filosofia, também na UFSC.

Porque tu voz habla otra lengua,
pero tu boca no.
Tu boca profiere
lo que hay en las entrelíneas
y no se precisa.
Tu boca, del otro lado de la frontera
perfectamente mía.
Porque tu boca habla al sesgo
y no habla en lenguas.
No necesita subtexto
ni de vueltos devueltos.
Tu boca de vuelos, es loba.
El contexto es el lobo del habla, ladrón.
Porque tu boca es igualita a la mía.
Y nosotros hablamos. Sin embargo, nuestros ojos
se besan. Porque tus ojos vinieron de otro mar
y son míos. Tus ojos
filisteos, navegantes, estrellitas,
tus ojos dicen todo lo que ves.
Somos nosotros. Nosotros. Nós dois.


Porque tua voz fala outra língua,
mas tua boca não.
Tua boca profere
o que há nas entrelinhas
e não se precisa.
Tua boca, do outro lado da fronteira
perfeitamente minha.
Porque tua boca fala de viés
e não fala em línguas.
Não precisa de subtexto
nem de trocos trocados.
Tua boca de trocadilhos, é loba.
O contexto é o lobo da fala, ladrão.
Porque tua boca é igualzinha à minha
e nós falamos, entretanto nossos olhos
se beijam. Porque teus olhos vieram de outro mar
e são meus. Teus olhos
filisteus, navegantes, estrelinhas,
teus olhos dizem tudo o que vês no escuro.

Somos nós. Somos nós. Nosotros.