Onde a ilha se encontra com o
mar, no ponto extremo, há um conjunto de rochas e pequenas piscinas calmas, em
movimento. A ilha tem a forma de uma vagina e, nesse caso, a morada das ondas
batendo nas pedras deve ser o seu clitóris. É lá que uma mulher se sente à
vontade para deitar ao sol sobre a superfície rugosa de um rochedo que respira há
bilhões de anos. Ali, a mulher observa os fluxos e as poças mansas que se
formam depois da extremadura. Ouve o farfalhar das correntes serpenteando as
pedras baixas, movimento contínuo de uma água que já baqueou, cantou raivas e,
depois, sossegada na areia larga, volta ao seu turno, unindo-se à montoeira de
mar que ali espera mais um trunfo do som do movimento das espadas. Nesse lugar, uma mulher pode parir e matar bem
as suas crias em apenas um segundo, pode meditar e se dizer adeus e tornar a
acreditar em um deus desconhecido. É ali também que os namorados se encontram
para selar o seu pacto, mas a mulher não tem impacto sobre eles. Deitada sobre
a pedra, agarrada ao seu eu profundo de movimento e gozo, ela vê os picos das
rochas se erguendo ao céu e sabe que é ao mesmo tempo feminina e masculina. Vê
os peixinhos minúsculos vagarem pelas piscinas calmas e sabe que não têm filhos
os oceanos e as marés, e os ventos que se precipitam sobre o seu rosto são carinhos
afoitos ou então impulsos que erguem as pernas dela, que agora apoia os pés na
pedra. Então, em posição de parto ou de orgasmo, aflita, ela se entrega à lua
que ainda não nasceu, mas já aparece vaporosa por sobre o horizonte de ondas. Uma mulher é uma mulher é uma mulher. Nada
pode detê-la. Ela corre sem pés na relva serpenteada de conchas e areia grossa.
E xinga os pescadores e ri com eles e os desova. Ela atrai com seus cabelos o
choro de uma criança. Uma mulher é uma mulher é uma mulher. Ela é ríspida como
quando o tempo vira. Sua cabeça respira o amanhecer e ela se sente completamente
vazia. É assim que é plana, sem necessidades. Agora as ondas se acalmaram e a
espuma abranda. Ela acende uma fogueira com o seu isqueiro e ali queima, um por
um, os retratos dos antepassados.