domingo, 20 de setembro de 2020

 

Uma mulher

sozinha no apartamento.

 

No frio do carpete sujo

que aquece os pés,

nua. Completamente nua,

sentada,

olhos que se evolam

pelas paredes,

vitrais do quarto.

 

O computador faz ruídos, às vezes.

 

É esquia e magra:

vazia

é tia, avó, irmã, sem nexo.

 

Está nua e só frente às máquinas.

Não há faunos. Florestas foram

concatenadas

no seu pensamento.

 

Em que pensa uma mulher

sem cajados

sem vestido branco

na brancura da pele lisa?

 

Seria mais de meia-noite

e haveria livros pelo chão,

todos abertos:

 

ela abre a página,

mói o livro

joga o livro −

 

e vem sentar-te ao meu lado, Lídia.

 

− Ela vigia o branco

pelos espaços de folhas

entre linhas tão correlacionadas.

 

Ela saboreia relações, depois:

joga.

 

Joga fora,

no chão acarpetado

do apartamento,

joga e ri.

 

E vem sentar-te

à minha frente, Lídia

não sou tão máquina

que não possa causar

no teu ventre

um espasmo cheio de palavras.

 

* primeiro poema do Desconjunto.